22.12.06

Feliz 2007



Caros leitores e amigos, por motivos de ordem profissional (pois, nesta época do ano o trabalho é pago a dobrar) o Lado Negro da Lua encerra temporariamente as portas. Fiquem bem, na companhia do Lendário Homem Tigre (foto) e que se foda o Natal. Até Janeiro.

21.12.06

Caminhando


Lembro-me ainda muito bem (agora, talvez melhor do que nunca) daquela prenda que os meus pais me ofereceram. Tinha eu os meus seis anos, e presentearam-me com um belo papagaio vermelho. Voava que era uma maravilha; parecia que quando o vento o fazia levitar gentilmente, nada mais importava. Eu cá em baixo, invejando-o, desejando poder voar como ele e, tal e qual, poder ver o mundo lá do alto. Ás vezes penso como seria bom voltar àqueles tempos. Aos 25 estava eu a acabar o curso. Aquilo é que foi uma festa. Eu e os meus melhores amigos, o Zé e o Miguel. Grande bebedeira; ainda me consigo rir ao pensar que até hoje a festa é apenas uma grande branca na cabeça do Miguel. E como esquecer a primeira namorada? A Ana do 6ºC, de cabelos e olhos castanhos, um sorriso do tamanho do mundo. O dia mais feliz da minha vida foi quando o Joãozinho nasceu, três anos depois do meu casamento. Aqueles grandes olhos claros fixados em mim, curiosos e vivos, transportando a esperança do mundo, mostraram-me que nem tudo está perdido nesta vida. Ora, ora! Há quanto tempo não me lembrava disto? O dia em que o meu pai me quis ensinar a conduzir, aos 15. Acho que a imagem do Ford todo espatifado à frente lhe ficou gravada na memória. Ah, mãe! Será que te agradeci tudo o que me ensinaste? Todo o apoio e carinho que me deste? Aos 32 casei. Conheci-a na casa do Zé. Fiquei absorvido pelo brilho dos seus olhos do azul mais puro e pelo seu rosto de uma inocência quase infantil. A partir daí nunca mais nos largámos. Tanto ficou por dizer tanto ficou por fazer tanto ficou por lembrar nunca há tempo nunca há vagar porra! Nunca há tempo p’ra ver o sol p’ra admirar o mundo p’ra te olhar nos olhos p’ra me perder neles! Não há vagar p’á puta da vida p’ra dizer que te amo e que és tudo p’ra mim e que sem ti não sou eu mas sombra da Morte o fantasma de um homem. Porquê hã porquê!? Ele é trabalho ele é contas ele é dívidas ele é um monte de merdas sem sentido e que não servem p’ra nada! P’ra rigorosamente nada! Nada! Há agora tem que haver eu quero que haja! Eu quero! Quero!... …Eu quero... Mas não há… Enfim, ainda vivi bons tempos… e são estes que prefiro lembrar. Para me alegrar, talvez? Ou para me convencer de que fui um homem bom, apesar de tudo? Fui feliz? Não sei. E agora, não interessa muito, é tarde. Estou na minha última caminhada, a mais longa de todas, mas a mais breve. Ouvi dizer, já não sei onde, que não dói nada. É o que digo ao Joãozinho quando o levo ao médico: é só uma pica, campeão. Vais ver que passa num instante é só uma pica passa logo não vou sentir não vou saber, depois, é só esperar, perdido em memórias, vivendo de novo, espero o desnascer, o partir, sozinho, no escuro, nú, indefeso, chorando por ti, pela saudade que terei, pela dor que vou deixar, só, sem pensar mais sem sentir mais sem saber mais. Já a sinto chegar. Abraça-me. Embala-me. Leva-me contigo. Diz-me que tudo está bem e leva-me… até ao fim sem retorno… naquela nova viagem.

Epitáfio duma paixão impossível



Queres os meus olhos e não sei como tos dar. Queres ver-te por eles e eles não te sabem ver. Queres que suba até ti e não te sei escalar.

Na minha imperfeição só a mim me vejo, só a mim me penso e nunca te sei a ti. Não te posso dar os meus olhos porque eles não te dirão nada de ti, apenas e só te contarão sobre mim. Como sou egoísta. Serei eu assim tão como todos os outros te são para ti?

Embriagas-me os pensamentos, toldas-me o discernimento e sinto-me um sapo ansiando pelo beijo de uma princesa encantada. Misteriosa, subtil, poderosa, mágica. Sim um sapo, nada mais do que um reles batráquio uivando à lua o desespero de uma paixão impossível. Todas as noites um corvo sobrevoando a janela que dá para o teu leito, espiando-te, espiando furtivamente os teus gestos, as tuas mudanças de humor, os teus desejos, os teus anseios e…. Os teus medos também.

E sou ainda e tão só o sapo que sou e que não percebe que jamais me beijarás. Como podias tu beijar um batráquio viscoso que até quando deseja que o beijes não é em ti que pensa mas ainda e sempre só em si? Não, não podias nem podes. Como me sinto (ainda e sempre eu e eu e mais eu) como me sinto mirrar, amarelecer, angustiar-me com o teu desdém, com o carinho, com o afago caprichoso do teu desdém soberano que me leva a ajoelhar-me perante ti e a adorar-te com o fanatismo duma intemporal devoção sobre-humana.

Queres os meus olhos. Tens uma faca? Estripa-os e leva-os contigo.

…………

Porque me escolheste? Foi ódio? Que mal te fiz eu? Sim, porque me odeias tanto, que mal te fiz eu? Eu que me escondo na minha toca, eu que só quando a noite foge e a madrugada se ergue na neblina me atrevo a sair do covil e ir a mirar o teu palácio dos sonhos, ainda uma e outra vez possuído pelo demónio do desejo que me arrasta as patas para a frente, estas patas esquálidas, esse demónio que me come vivo, que me leva ao inferno e de volta ao paraíso quando o sol se ergue e tu sais para vida e eu tenho de voltar para a morte sem ao menos me poder saciar na contemplação da beleza que irradias.

Tens-me. Sou teu. Sim, já sou teu. Faz-me o que for capricho teu fazer-me. Destrói-me, lava-me, suja-me, deita-me fora, eu, sim eu, eu outra vez eu, eu quero morrer em ti, quero mergulhar em ti, quero ser usado por ti, manipulado por ti, quero que me faças mal, quero que me destruas, quero morrer em ti. Morrer em ti.

Que esperas ainda? Mata-me! Mata-me já te disse, ordeno-te que mates! Que me trucides! Mata-me!..

Quem julgas tu que és? Vens aqui e suavemente rasgas-me tudo o que tenho de mais sagrado, roubas-me a alma e a vontade e agora partes assim, sem ao menos me perfurares as órbitas e me levares em sangue estes olhos que já tanto viram e que um dia jurei um dia não dar a ninguém?

Quem julgas tu que és? Quem julgas tu que sou? O teu sapo? Não, eu não sou um sapo, sou um animal nobre, um animal que vagueia solitário pelas fragas das serras evitando a companhia dos homens e deleitando-se no frio das rochas de granito que me acariciam as pegadas silenciosas.

Não me vires as costas, não me vires as costas que ainda não te terminei, ainda não te disse tudo o que te vi e que nunca te direi senão na hora em que me tiveres morto. Vem cá, vem cá sem te demorares, vem cá, vem cá…

Mata-me.

20.12.06

A vingança



Faz um mês que todos os sábados à noite me bato ao Bar da Cristina. Vou lá desde que tinha 16 anos e o Olívio achou por bem representar-me uma noite, vá, digamos: “normal”.

Na realidade já não punha os pés no Bar da Cristina há uns bons cinco anos mas, ultimamente, como tenho estado a viver numa casa que os meus pais me emprestaram, deu-me para revisitar o passado. Estou retrospectivo, se quiserem.

Da primeira vez que entrei no Bar da Cristina, apesar da tenra idade, ia preparado para tudo, já que com o Olívio nunca se sabe o que é uma noite “normal”. Mas, dessa vez, até que o foi.

Bom, este texto não diz respeito ao Olívio. Até porque depois disso já lá fui sozinho e acompanhado. Recomeçando, faz um mês todas as noites de Sábado que vou ao Bar da Cristina e esta prosa pouco ou nada tem a ver com o Olívio.

Diz respeito a mim e a mais algumas pessoas e em último lugar diz respeito ao Olívio.

Ou melhor, diz ainda uma coisa de nada respeito ao Bar da Cristina, visto que em vinte anos não me recordo de alguma vez ter estado na presença da Cristina, num outro sítio que não fosse o bar dela. Nem quando era puto. Nem quando eu era, nem ele, que sempre foi um menino muito precoce.

Acabo de chegar a casa vindo de lá e tão impressionado cheguei que não resisti em dar-vos conta das emoções que me avassalam. Uma coisa correu bem: vá lá, desta feita, o Olívio ficou em casa e não se lembrou de aparecer de surpresa. Estive no Bar da Cristina uns 10, 15 minutos. Tá tão gostosa... Mais do que nunca. Mas, como para todos os efeitos nada tenho a ver com isso, espero que nem o Olívio nem mais ninguém se lembre de ir armar merda à conta dos dois beijinhos que trocámos.

Foram 10, 15 minutos, o que deu tempo suficiente para estacionar mal o carro à porta, assim como quem descuidadamente se faz anunciar, beber uma cerveja e botar na Cristina uma palavra adocicada em tom de sofrimento inapaziguável.

Por falar nisso, não deixa de ser curioso como o meio de locução (ou será de locumução?) de um homem contribui para nos sentirmos seguros e ousados. É só um parêntisis, acho que o Freud disse algo sobre a matéria. Pouco interessa.

Já é a terceira noite de Sábado consecutiva que vou ao Bar da Cristina. Estou a gostar de lá ir, aquilo está meio para o vazio e a espaços sou só eu e ela, cada um na sua, a fingir que não há electricidade no ar, palhas não palhas um roçanço.

A Cristina é atraente e já tenho reflectido acerca disso desde que tinha 16 anos, quando a vi pela primeira vez, tinha ela 20 e o Olívio, idem aspas, aspas, muito embora seja um tipo cuja idade não se define. É gira, a miúda. Era gira e continua a ser muito embora seja desconfiada como o raio.

Ou será que isto são os copos falar? Hoje demorei-me um pouco mais por lá e como já tinha bebido umas quantas antes, não sei se às tantas não estarei a fazer juízos de valor sobre a pessoa da Cristina. Lá que é boa como o milho é. Baixinha, toda curvilínia, um rosto de determinação e desconfiança permanente, é aquele tipo de mulher que dá mesmo vontade de... Se é que me faço entender.

Pouco mais sei, vicissitudes da vida, já a gramo há muitos anos, mas nunca se proporcionou. No próximo sábado canta. E o Olívio, que já sabe da música de cor e salteado, preferiu ocultar-me tal temática, tão ou tão pouco espinhosa para o prosseguimento das nossas amigáveis relações. De facto, nunca se pode confiar no Olívio.

Não deixa de ser realmente uma foda ela namorar com um antigo patrão meu, namoro sério, um tal de João do Vasilhame, do tempo em que o ajudava a vender lotes de terreno aos avos. É chato, visto tratar-se de um gajo bacano, conhecido na praça, respeitado no município e para lá das suas fronteiras. Para além disso é um homem de dinheiro, socialmente regenerado, proprietário de terras, detentor de negócios no estrangeiro, em suma: é um tipo com Poder. Realmente, é chato.

Diga-se, em abono da verdade, O João do Vasilhame (claro que não é assim que a ele se referem quando está presente) até belas mocas um dia me representou; entre outras uma menage à cinque. É que esse meu antigo patrão tem uma filosofia que justifica o seu sucesso: a razão é a de ele estar firmemente convencido de que para embrulhar a malta não há nada como LMR; tradução: Louras, Morenas e Ruivas.

Mas a Cristina sabe que eu a acho gira e eu sei que ela também me acha giro. Foda-se. O cabrão do meu antigo patrão sempre teve bom gosto. Isso corta uma beca a tesão mas se quando uma mulher agrada ao Olívio e ele lhe agrada a ela o meu amigo esquece logo merdas insignificantes dessas e toma as rédeas da coisa sem grandes preocupações, porque razão não o devo fazer também? É, a Cristina canta no Sábado, e a ver vamos que músicas tem para me cantar...

19.12.06

Pensamento do dia


"One of life's most painful moments comes when we must admit that we didn't do our homework, that we are not prepared."

Merlin Olsen, estrela da NFL, actor, comentador, etc.

18.12.06

Master of Puppets



When was it? Let me see, it must have been a year and couple of months ago. I was fresh in B and back home the Presidential heat was on. I can’t really remember when or how I got to meet Mr Master of Puppets. For argument sake, let me just tell you I was amazed at the quality of his work, the sharpness of his satire, the shrewdness of his humour. There I was, amazed that someone from back home could be so jagged could be so cool, so reinvigorating, so much like everything I had never seen in my native grounds.

It didn’t take much to befriend Mr Master of Puppets. You see, Mr Master of Puppets is a very lonely guy, because he’s so fucking talented and talent is such a fucking lonely gig to play – especially in a country like ours. And I, I was extremely naïf. From day one Mr Master of Puppets saw that I was nothing but another puppet. However, being such a cunning judge of characters, he also spot two things about me that could be useful to him: I had a certain amount of talent and I had the vibe; passion for high standards, hate for our common enemy.

Back then, Mr Master of Puppets was waging his own little private war against a very powerful man and when he noticed that he had a follower, a potentially talented follower, a devoted puppet paying tribute, he decided upon alluring the follower to the war and so he even gave him an honorary - if completely false - equal allied status.

How I was delighted! I was fucking bloated! There I was, fighting the war side by side with the master, mounting up, developing powers I didn’t even knew I had within me; there I was, in the big boys league, skirmishing the forces of darkness (or so I thought); there I was, building myself a reputation, at times even overshadowing the master himself!

The war dragged on and on. It was bitter; it was not a pretty war. For each victory ten defeats. It was all over the Press: ours' was a lost cause.

Nonetheless, we fought on and on to the end, and in the last battle, drunk with the rage of despair, we threw at them fuckers everything we had, everything; every little fucking piece of ammo we had left in our shabby armoury. By nightfall we got word. Our side had lost.

To this day I’m proud of our stance, of our resilience, of our courage, but the fact remains, in the end, our side lost. In the night of defeat, my heart full of pain and despair, I humbly went to my master and laid tears deride tears upon his shoulder. In a way, Mr Master of Puppets despised me for the childish sobs I so abundantly lay down on his lap. Of course, defeat had taken a toll on him too. But he knew the odds from the beginning, and he wouldn’t be a Master of Puppets had he not knew them.

He was furious with himself for me and for my infant like manner. Oh yes, he utterly loathed me for being such a child. And he loathed me even more because my sadness got to his heart and he too felt the pain a Master of Puppets is not supposed to feel.

From that day on, although I was unaware of it, how naïf was I, Mr Masters of Puppets decided I was in need of a good old fashioned beating, a good trashing, just, you know, to sort me out, to help me realise the world is not fair in any circumstances and you either cope with it or the son of a bitch next door chews you half alive for breakfast and shits you half dead into a black desert.

And so he did. It was a vile, cruel lesson for someone like me. Mr Master of Puppets resorted to all means to show me who was in charge and what was at odds, not in our personal duel, but what had always been at stake for him all along throughout the war. You see I had been a mere pawn in the war, the real force had been Mr Master of Puppets, and although our enemies couldn’t give a toss about me, they hated Mr Master of Puppets, almost as much as he hated them, and still does.

He planned my lesson with the subtle strategic approach of a Count Von Moltke charged with the ruthlessness of a suburbia panzer general. Hell, the element of surprise he mastered like very few indeed. First he felt his enemy, delivering cautious slaps, because by now he was aware his dealings were not the dealings of master and follower but those of master and pupil. He had trained me well and was aware my talents had multiplied a thousands times since we had first met. After the first squashy punches, I intended to fight back, and so I did. With the determination of youth, I said to myself, fuck him, I got something going for me this wancker hasn’t: I got street wise.

Unfortunately, street wise strategy might even be fit to defeat a regular foe; not a Master of Puppets. At a given moment I thought I had him against the ropes; oh, naïve ness, naïve ness… In the most fierce moment of our duel I found out something about my master I had never suspected; not only had he a bag full with the most disgustingly dirty tricks you can imagine, but also he applied then on his opponent with the cruelty of a Gengis Kan.

And the fight kept on, I was losing my feet every single fucking day but the roundness of my pride instilled me with the courage to keep on fighting. And Mr Master of Puppets kept on, delivering blow after blow; for each victory of mine there were ten of his. Finally, one day, he had me at his mercy, completely by the balls.

In that night, I didn’t cry. I went home and decided to play it quits. I left the country and went back home. Sensing that I had admitted defeat, Mr Master of Puppets never bothered me again, although I know he sometimes comes here, to check on my progress. I think he liked me once, and I think sometimes he still does. If he didn’t, these words would have never seen the light. Despite all the suffering he caused me, today I cannot but say: it was a very fucking good lesson the one Mr Master of Puppets thought me.

You see, today, I’m not a Master of Puppets; neither have I aspired to be one. It’s too fucking lonely. But I can tell you one thing I’m not. I’m not a puppet and I smell Masters of Puppets or fellow apprentices by the mile.

This is it



This is it. Don’t ask me how I know it, I couldn’t explain it myself. It’s just this feel I got that this is it. You see, I’ve always been a very intuitive person. And, what’s more, nine out of ten my intuitions turned out right. Yeah, ok, what about those ten per cent you got wrong? How do you account for those? I’ll tell you: I didn’t believe hundred per cent in those intuitions and so I was wrong. They were intuitions but they weren’t crystal clear as all the others. And you know what? This morning I got out of bed at five AM feeling miserable, so miserable you can’t imagine and, all of a sudden, bingo. Call it what you wish, intuition, change of heart, plain foolish thought, and you might even be right. Nonetheless, I just know it. This is it, simple as that. Don’t ask me how I know it, I just do. And so folks, have a very beautiful life, rise and shine, there's a wonderful world out there, thousands of books to be read and at least one to be written. The book of life, the book of your life and remember, trust your intuition, follow what your heart tells you. Nine out of ten it is right.

PS - How’s this for a celebration? Yeah, true, tomorrow it can all turn sour but today I’m happy, today this blog is not about death, it is about life, and drinks all around!

Photo: Picasso.

Pensamento do dia


"Grow old along with me the best is yet to be."

Robert Browning. Mais, aqui.

17.12.06

“List der Vernunft”



Tenho de te confessar. Não gosto de gajos como tu. Não gosto, pá. Para começar, tu foste à faculdade e eu tive de me contentar com a universidade da construção civil. Depois, tu tens guito e eu não. E, para cúmulo, como os teus amiguinhos não são trolhas tu resolves tudo com duas penadas e já eu fico sempre na merda. Não, pá. Não gosto mesmo nada, nadinha de gajos como tu que olham de raspão para esta porra e tiram a pinta a um gajo após lhe lerem duas palavrinhas.

Nunca gostei de gajos como tu. Sabes o que é? É a escola das obras, pá. Ensinou-me a não gostar de gajos como tu que do alto das suas confortáveis chaise longues à séc. XVII e enquanto beberricam um whiskizinho de malte, com três frases bem construídas dão cabo dum homem sem ao menos terem ido além da segunda palavra que lhe leram.

Sim, porque tu és culto e sabes muito bem que ao whisky bom os escoceses guardam-no para eles e essas merdas que vemos aí à venda é tudo zurrapa a fingir para dar à parolada aquele feeling de que até são gente com G maiúsculo quando o que são é uns pobres diabos todos os dias manipulados por tipos como tu.

Qual Chivas Regal, qual Ballantines, qual caralho. Não, filho, tu és um gajo culto e tens dinheiro. Por esse estreito só passa zurrapa de requinte. Glenmorangie, Glendifich, Isle of Jura, Talisker e assim que para mim sobra o VAT69 acabadinho de destilar em Sacavém e que eu lá tenho de ir buscar não à tua garrafeira do séc. XIX mas ali ao LIDL acabadinho de abrir a pensar em gajos como eu.

É assim mesmo, não é filho? Vês com eu leio esta porra tão bem? Já viste esta, olha-me este tipo, pensas tu, olha-me este Lobo, este Lobo o quê? Olha-me este, mas tu alguma vez vais ler uma bosta qualquer escrita por um gajo chamado Lobo não sei das quantas? Não, pá, já me tiraste a pinta, e basta, não é? E depois, ler dá tanto trabalho, foda-se, já viste a canseira que não é?

Para que é que hás de ler o que diz um matarrulano da construção civil que assina Lobo Solitário? Lobo Solitário, pois, pois, o que um gajo que assina Lobo Solitário quer são figos.

E pois quero filho, julgavas que eram todos só para ti?.. Isso é que era bom, meu, porque é que hão-de ficar os figos todos só para ti? Pois, pá, é assim mesmo, um gajo das obras quando lhe dá na mona para andar ao soco com a cabeça é uma chatice.

Manda foder, pá, esses gajos das obras são todos uns borcejos iguais sem tirar nem pôr, ler um é lê-los a todos, puta que os pariu, não tens tempo para isso, são uma merda os gajos, e tu e os que são como tu sabem isso perfeitamente. Não, pá, gajos das obras dão-te jeito quando queres instalar a marquise nova ou a retrete se te entupiu, aí até que és cheio de mesuras com a malta, não vá um gajo regar-te a tampa da sanita com ácido sulfúrico, fora isso, distância que essa gente é muito pouco recomendável, não é filho?


Eu percebo-te, pá. Tens muito mais que fazer e ler dá-te muito trabalho. Não te esqueças é que escrever ainda dá mais. Se bem que isso, tu até já estejas farto de saber, claro, e quando precisas resolves um engate sem espiga de maior e os teus figos até te cantam loas. É tão fácil, não é? Vais ali à estante e zás, toma lá Tolstoi, zás, toma lá Hemingway, zás, toma lá Eurípedes, zás, toma lá “list der vernunft” que com essa é que fodes a malta toda, fica tudo sem dormir a matutar no que “list der vernunft” queira dizer…

E depois, tu até tens uma estante tão bonita e tão bem recheada com os clássicos da Filosofia, da Pintura, da Literatura Universal! Os teus figos derretem-se todos com a tua erudição, não é, pá?

Não pá, esses figos não te chegam, mas tu não lês e depois vens mandar umas bocas à Silvester Stalone da Literatura de cordel e como os teus figos não te chegam, não sabem a nada, sentes-te mal, pá. E então, pimba, malhas no trolha, quem é que esse filho da puta julga que é? Olha-me esta, um trolha de merda a bater-se a figos doces que até eu gostava de comer, mas não tenho habilidade para isso…

Pois é pá, não lês, julgas que um gajo só tem de ler cotações da bolsa e o Expresso aos fins-de-semana, e depois, olha, é assim, como diz a malta que tanto desprezas.

Ler que leiam os outros, não é filho? E de preferência livros de putas que é para ficarem sossegadinhos enquanto tu e gajos como tu tocam esta merda para a frente que a Literatura para as massas é a das putas e assim é que é bonito e tu tens mais o que fazer. Mas olha que se calhar incorres em erro, filho.

As aparências desiludem. Às vezes é precisamente nos livros de putas que tu encontras o mais fiel retrato do mundo em que vives e olha que os trolhas não são tão parvos como parecem. Julgas o quê? Julgas que tiras assim a pinta aos gajos com essa arrogância, com esse teu desdém blasé de quem tem amigos bonitos, de quem tem uns dinheiros, de quem tem uma estante recheada de séculos e séculos de sabedoria?

Põe-te fino, meu, olha que os gajos não são parvos de todo e uma coisa que os gajos sabem, lá está, sabedoria que não se aprende nos livros, é que “quem não se sente não é filho de boa gente”.

Põe-te fino, pá, por cá ainda anda tudo entretidinho a jogar aos figos amargos, mas vê bem os gajos lá do Médio Oriente? Tu estás a ver o filme, tás? Full Metal Jacket, dá-lhe Full Metal Jacket e se for só isso vamos cheios de sorte, apre!

E os bacanos em África? Como é que é? Ora diz lá, como é que é, meu? Por enquanto estão a dormir, olha se resolvem acordar? E já nem te digo nada dos Chineses, quando esses gajos se lembrarem de que têm o Mundo pelos tomates não vai haver “list der vernunft” que nos safe…

Pois é pá, é uma merda, tou cansado, são seis da manhã e vê lá que ainda não fui dormir à conta da malfadada “list der vernunft” e à pala da ligeireza com que tu lhe passas os colhões por cima. Olha, vou deitar-me e tu, quando acabares de ler isto, levanta mas é o cu da poltrona de couro e vai ler a tua mulher.

É uma merda, ler esse livro, não é? É como os outros, aliás. Dá trabalho. E até já o leste tantas vezes, como os outros, aliás… Tás ver bem o frete que é ler um figo que já leste um mar de vezes?.. Dá uma trabalheira do caralho, não é verdade?

Mas olha que a tipa gosta que a leiam, pá. Por enquanto, a gaja vai-se conformando e aceitando que ao invés de a leres lhe dês perfumes caros e umas fodazitas ao fim-de-semana. Mas põe-te a toques, meu. Não tarda muito os filhos estão criados e olha que ela gosta mesmo que a leiam. Gostam todas, todas as que valem a pena, e olha que a tua gosta de ti e quer que sejas tu o bibliotecário. Se te demites dessas funções, mais tarde ou mais cedo tás fodido. Por isso, não te esqueças, vai lê-la. Só te digo, se não o fizeres, quem ainda o faz sou eu.



PS - Lá me esquecia do mais importante... Reclamações apresentar ao grande amigo José Mário.

16.12.06

Pensamento do dia


"It keeps you fit - the alcohol, nasty women, sweat on stage, bad food - it's all very good for you."

Bon Scott, a few years before choking on his own vomit. Too much Dynamite, i guess...

13.12.06

Mike


Christmas! Nothing like a good holiday to put everyone in a good mood. Well, not everyone exactly. You know, my friend Mike isn’t in a really good mood. Not really. He hates his job, he abominates his wife; actually, his whole life hasn’t turned out to be exactly what he wished. In the precise moment I’m telling you this, he is on his way to visit his “friend” (like he calls him). Actually, his “friend” is his shrink. But, I indulge him, you know? I just go with the flow. Who am I, you ask? Well, I’m Mike’s best friend, even though he won’t admit it. If you ask him what he thinks of me, he’ll probably say I’m a big pain in the neck. However, I’m the only one who understands him, who’s there to hear his endless bitching, when he goes on and on and on about how he hates his job and how he wished his wife had an inoperable tumour at the base of her spine. Well, anyway, my name is Rudolph, and I’m here to tell you about Mike’s story. Why? Well, I don’t really have anything else to do. Besides, I’m planning on selling this story to a publisher, make loads of money and move to Hawaii. Anyway, enjoy!
"Good morning, Mike! How are we today?"
"Well, I can’t speak for you doc, but I’ve been better."
"Really? I suppose it’s the same, then?"
"Yeah... I’m tired, doc, you know? My job is killing me. I just can’t take it anymore."
"Hm… I see. Tell me, Mike, you’ve been my patient for one month now; however, you never told me how you became Santa. Why don’t we begin there?"
"Yeah, I guess. It all began about 2000 years ago…"
There I was all alone in the forest, somewhere in what is now known as Sweden (I was a druid, by the way) picking some herbs and mushrooms for my magic potions. Suddenly, I saw a light behind some bushes, and it started calling out to me. “Mike, Mike…” I got to tell you doc, at this point I had already wet my trousers, but still I went to see what it wanted from me. And, then, in front of me, there it was, a glowing figure dressed in white with big, feathery wings.
“I’m M-Mike.” I stuttered.
"You’re Mike?" the guy asked. "Funny, I thought you’d be fatter."
"Huh?"
"Never mind about that. I’m here to deliver a message from God."
"God?"
"Yeah, God. The big guy who created everything and everyone, who sees and knows everything… Don’t worry, soon the Roman Empire will fall, and you’ll know everything about Him during the Middle Ages."
"What the hell are you talking about!?"
"Haha! Hell! That’s a good one! But anyway, here’s the message. Ahem, quote: 'Don’t forget to buy milk and…' No, wait a minute. This is for Gabriel. Where did I…? It’s got to be around somewhere. Ah! Here it is! Ahem: 'From this day forth, thou shalt be known as Santa Claus, and thou shalt spread happiness throughout the planet, giving presents for all children on the 25th of December (Roman Catholic Calendar), for all eternity.' Please, sign here!"
"Hey! Who says I’m interested? I like my life here! Besides, I worship Odin."
"Look, kid," the angel sighed impatiently, "you don’t really have a choice here, okay? When my boss makes up his mind about something, there’s nothing you can do. Besides, read the contract: you work one day per year, you don’t pay housing and it’s for all eternity, which means you get to be immortal. How cool is that? Now, sign!"
And, hesitantly, I signed, doc. Well, it seemed like a good idea at the time! How many chances of becoming immortal do you have?
"Thanks, kid! Good luck!" the angel said has he began to fly away.
"Wait! There are still some questions I want to ask!"
"Sorry! I’m in my lunch hour!"
And he just vanished into thin air! That’s what happened, doc. I ran home to tell my wife and, all of a sudden, we were in bloody North Pole! Useless to say she was pretty pissed at me for not consulting her in my “career change.” And don’t even let me get started about Martha! Jesus! Imagine what’s like to be married with the same woman for 2000 years, especially when she is still mad at you because she has to live in bloody North Pole! I even thought about divorcing her. The thing is my Boss isn’t exactly crazy about divorces! I swear to you, after the first 250 years I already wanted to twist that skinny little neck. Sometimes, I even fantasise about it… Fortunately to her, she spends Christmas with her family; at least the unlucky ones she didn’t lose track of.
"Hm… interesting story, Mike. It looks like our time is up for today. I suggest you go home and rest. Eat a good meal and just relax, all right? No stressing activities! I’ll see you next week."
When leaving the psychiatrist office, Mike wondered if he should really waste money on this guy. All the arsehole would do was nod for a bloody hour! Even his reindeers could do that! Anyway, he really didn’t want to think about it.It was a cold, snowy day. Mike was strolling around New York (yeah, we don’t have psychiatrists in the North Pole); he could see the people hurrying along the streets, the shops full, the traffic jammed. “December: the most stressful month of the year.” Mike mumbled “People buy everything in shops nowadays. I don’t really know why I have to keep up with this goddamn job! Oh, it’s for the children, they say. They need fantasy in their life, they say. Do you know what I say? Fuck’em! If they want fantasy, they should tune in on Jerry Springer. Now, there’s some fantasy for you, kids!” And there was Mike, bitter, thinking about what other problems were waiting for him at home. He had just hopped on to his sledge (cleverly disguised with magic powder to look like a car, so that you folks won’t recognize it), when he noticed a small paper stuck to his wind shield. “What the...? A parking fine!? Yeah, just what I needed! Merry Christmas to you too!" he said out loud. "It’s always something, goddamn it!"
After a long, extenuating (and very cold) journey back to the North Pole, Mike finally got home. He didn’t actually call it home. He liked to describe it as his "goddamn shithole.” In truth, the house isn’t exactly a palace worthy of an immortal guy whose job is to bring happiness to the children of the world; the central heating doesn’t work, the second floor toilet shower is leaking to the kitchen downstairs, the other toilet has bugs and the electric installation is a death trap. Oh, and the decoration is horrible. In fact, I think my stable is much better.Oh! I heard the door. I guess Mike got home.
"Hey, Mike!" I greeted him. Mike mumbled a kind of 'hello' in response.
"Do you have a cigarette?" Mike asked.
"Sorry, Mike. You know I’m trying to quit. Do you know how hard it is to travel around the world coughing all the time?" I answered. Mike mumbled something, but didn’t answer. He just sat on the sofa, drinking a beer and watching TV.
Great! He’s in a bad mood, again. And I’ll have to be the one giving him the bad news. I thought to myself.
"Hm… Mike, I have bad news." I said cautiously.
"What? More bills?" he replied panicking. "I already got a part-time job at Burger King! If you don’t want to go to unemployment, you get a goddamn job!"
"I can’t, Mike."
"Why not!?"
"I’m a reindeer, Mike. The lack of opposable thumbs makes it difficult for me to flip burgers. But, anyway, about the bad news. Do you remember the threat the elves made to go on strike if you didn’t give them a raise?"
"Yeah… So?"
"Well, they shut down the toy’s factory."
"WHAT!?"
The next day, Mike stormed to New York to see his shrink, even though he was only supposed to go there next week.
"Mike? What are you doing here? Our next appointment is only next week."
"Yeah, yeah, I know, doc. But, I really need to talk to someone. Come on, doc, you’re not going to deny a favour to old Santa here, are you?" Mike pleaded eagerly.
"Tell me, Mike," the psychiatrist said patiently, "what’s happening?"
"Catastrophe, doc, catastrophe!" Mike said desperately. "My elves are on strike. They shut down the factory, yesterday. They say they want a raise. A raise! Can you bloody believe it? It hasn’t even past 200 years since I gave them a raise. Those greedy bastards! I tell you, since they began reading Marx that they’ve started to think they’re all big shots. There I was drinking my beer and watching Manchester vs. Chelsea; just like you told me, no stressing activities, when Rudolph just lays this one on my lap. I had to go to the factory to have a little talk with the damn midgets…"
Try to picture 1000 little green monsters, ugly as hell, dressed in red and white stripes in front of a big, old factory in the middle of the North Pole. Now, triple that number! I just got there with Rudolph and I went to talk with their union representative:
"Go get them, Mike!" Rudolph whispered.
"What’s the problem, Mr. … elf?" I asked, courteously.
"We want a raise, Mr. Claus!" the elves’ representative demanded, whilst thousands of mutinous elves were protesting behind him.
"What the heck are you talking about? I just gave you folks a raise some time ago!"
"Some time ago!?" the elf gasped. "You call 200 years some time ago?"
"Yeah, for a 2000 years old man, that’s yesterday!" – I answered angrily.
"Well, don’t count on us to produce any more toys for you until you give us a better pay! Do you know how hard it is to raise a family with what you’re paying us? Do you know what the average of children per family is? Thirty, Mr. Claus! Thirty!"
"Well… have fewer kids! I can’t give you a bloody raise! My house needs rebuilding; I need a new sledge, some of my reindeers died, so I got to buy new ones. Do you know how much a reindeer costs? Do you, you little green midget? I also have to feed them, mind you! Oh, and if it’s not asking too much, I also need money to eat! And don’t think my magic powder grows on trees, because it doesn’t. Fairies are also greedy little bastards, just like you, and they don’t sell it cheap! Now get the hell out of my sight and get back to work!" I barked furiously, as I walked away. "It’s always something, goddamn it!"
"And that’s pretty much it, doc! I tell you, I’m in a bind here! My Boss hasn’t given me a raise since… well, never. He’s all powerful, all perfect, all knowing, all wise; he just can’t handle money! Every time I call Him he says something like: “Gee, Mike, I’m sorry, but I have some pressing matters to attend to. War in Iraq, terrorist attacks, hunger in Africa, Christian conservators… The world is completely screwed up, you know? Make an appointment with Uriel, ok? I’ll probably have a free day in 40.000 years time.” I don’t know what to do! I’m drowning in bills: gas, electricity, cable (yeah, only rent was included in the contract. I guess He forgot to tell me that!); do you know how expensive it is to have those kinds of services in North Pole? My house needs serious remodelling, my sledge needs a new painting, I got to buy two new reindeers (the stupid animals found my anti-depressives and died of overdose, can you bloody believe it?), the fairies are all over me because of the magic powder debts, and now Martha wants a boob job. After 2000 years, it’s not going to make a difference, I tell you. But, hey, I’m not going to be the one telling her that! And to top it all, the elves are on strike! Tell me, doc, what am I supposed to do? I’m tired of all this! And you don’t just ignore a contract signed with God! I tried! I really, really, tried to make this work." Mike said, sobbing uncontrollably.
A long moment of silence passed, during which only crows could be heard outside, and Mike’s sobbing inside, his wrinkled face buried in his hands. Slowly, the psychiatrist got up and started walking the room, with sure steps, without saying a word. He approached Mike from behind, put his hands over his tired, old shoulders and said:
"Now, now, Mike. There’s no need for crying. You know, I may have the answer for all your problems." the psychiatrist whispered in Mike’s ear, a smirk in his face. As slowly as he had got up, he sat back on his chair, and calmly continued speaking. "Mike, I work for a very powerful… man. My boss is a businessman, a serious man, and he’s been keeping an eye on your work for a long time. He knows Mike, he knows how hard you work. He knows how, despite all your efforts, God just plays a blind eye to your problems."
"He does?" Mike said, drying his sad, blue eyes.
"Oh, yes! Of course! My boss is a caring man. He never lets one of his employees down. Our… company is like a big family. We’re all here to take care of one another. And, Mike, my boss likes you. Don’t ask me why, he just does. And when my boss likes someone, he means it! That’s why I’m here, Mike… to help you!"
"But, what about my contract with God?"
"Don’t you worry about a thing, Mike! I have a contract here that will allow you to rescind your contract with God permanently, that is… if you sign it."
"I don’t know…" Mike said, suspiciously.
"Mike! Mike, would I trick you? Hein? Your Boss is the one who’s screwing you around."
"I guess…"
"He doesn’t respect you or your rights."
"That sure is true!"
"And, more importantly, he doesn’t respect your feelings, Mike!" the psychiatrist said enthusiastically, whilst holding Mike’s hands over the table. "Your feelings!"
"No, he doesn’t!"
"You see, Mike? I’m not the bad guy, here. According to this, once you sign it, you will be free from all your obligations with God and, in return, you will be another happy employee of Lucif… I mean, Lucius, corp." the psychiatrist said with a big grin on his face with his dark eyes glowing ominously. "And for you, we have a desk job. No more flying around the world in one night with a big, heavy bag of presents for spoiled, ungrateful children, no more debts, no more problems with your house or your reindeers, no more bothersome elves and fairies demanding money you don’t have and, more importantly, this contract is wife free; it’s up to you! Hein? What do you say?"
Mike stared at the piece of paper in front of him, ever more convinced that this was the right option. The psychiatrist could read Mike’s feelings, he could sense his doubts, his fears, and so he struck a final blow:
"You don’t need to rush, Mike! Remember, no one’s forcing you to do anything (unlike others). Take your time, think. And, if you don’t want to, you can just go out this door and go back. Go back to your falling house, to your debts, to your elves, to your wife, to your Boss… Well, I’m sure you’ll make the right choice."
Calmly, and without saying a word, Mike slowly took the pen and signed the contract. The psychiatrist eyes shined in triumphant joy, but his face didn’t reveal the thrill that it was to tempt Santa Claus himself! Fortunately, Santa had committed the same mistake and did not read the small print. It would be too late when he realized his soul would forever belong to his Master. Surely, he would be promoted for such a precious acquisition, for pulling the carpet under God’s feet so easily! He could already smell the promotion to archdemon, the entry into the first hierarchy, where all the important demons belonged! Finally, he would leave his shitty job on earth, and have the appreciation and respect he deserved!
"There!" Mike said. "It’s signed!"
"Good! Good!" the dark angel said happily, whilst hastily grabbing the contract. "You’ll be hearing from us." he said when leaving the room.
"Wait! When?"
"Oh! Soon… Very soon!" he answered with a big, eerie smile beginning to form in his lips, and, then, the smile turned into a laugh.
But, it wasn’t just an ordinary laughter; it was filled with evil, hate and disgust. Something like Mike had never heard before! Suddenly, it struck him, and Mike realized the foolishness of his act, whilst hungry, fierce flames enclosed him. And all the bad feelings of the world enshrouded his heart: sadness, hate, anguish, frustration… And they swirled in his mind, growing and growing ever bigger and more powerful, consuming him, bigger and bigger UNTIL… Mike woke up! He was in bed, and it was 3:16am of December 23rd. By his side, his wife was sleeping peacefully, a sleep without dreams. It had all been a dream, just a terrible nightmare! Thank God! Martha was right, he shouldn’t eat sugar before going to sleep; it always had that effect on him. “Well, better go to sleep.” Mike thought cheerfully. “Tomorrow I have a very, very busy day.”
THE END
Written byRudolph, the reindeer
Well, I hope you all enjoyed it, because the publisher didn’t. They say it has “no storyline or plot whatsoever, the characters are poorly described and it makes no sense at all in the overall”. Humph! What do they know about art? Oh, well, I guess I’ll be just another exiled artist, writing to myself, until one destined day, long after I die, someone discovers my work inside a box, under the bed, who knows? Until then, I have to go to work! See you all soon!
THE END

O grupo dos cães danados



O Bar do Ferro ainda existe apesar de ter mudado de rua à pala da “remodelação” que a Musgueira sofreu há atrasado. Mudou de sítio, mas a canalha é a mesma e até as baratas parecem ter acompanhado o resto da escumalha na mudança. E que dia épico esse foi, quando a vizinhança do novo bairro do Bar do Ferro deu fé de que a sua propriedade, a qual tão pouco já então valia, passara, de um dia para o outro, a valer o que vale a vida de um gajo que viva os dias enfurnado no Bar do Ferro, ou seja, nada: zero

Como é que o Ferro consegue evitar que a fiscalização lhe feche a porta é uma coisa que ninguém nunca perceberá lá muito bem. Nem no poiso antigo, nem agora no mais moderno. É assim uma merda que parece um anacronismo, e se bem que há uns anos atrás passasse horas e horas a discorrer com os meus botões sobre tão intrigante matéria, hoje em dia não dou dois peidos pelo assunto. Que se foda, é como é e pronto. É como a Religião, não se explica, e a bem dizer, quer a mim quer a ele, até nos convém.

Isto, se bem que eu cá tenha a minha teoria, que tem a ver com eu achar o Ferro um dos bacanos mais “diplomáticos” que alguma vez tive o prazer de conhecer. Mas na volta não será só isso. Enfim, suponho que sejam ainda os “contactos” do Pastor, ou talvez seja tão somente por intermédio dos “bons ofícios” do nosso amigo Olívio, o qual nunca brinca em serviço, e que quando olha um tipo da fiscalização nos olhos até parece que o homem se vai borrar instantaneamente, vítima de um súbito e inexplicável surto de difteria.

Mas eu já vos tenho dado conta de como é a que as coisas se passam com o nosso amigo cigano. O Olívio é um amigão do peito, até porque tê-lo por inimigo, só vos digo que é encurtar abruptamente a esperança de vida a um gajo.

De qualquer maneira, amigos ou não, hoje em dia é muito raro ir ao Bar do Ferro. Tenho outra vida, tenho uma mulher que me agrada, e meti-me em tantas ou tão poucas complicações quando aquela era uma espécie de segunda casa para mim, que actualmente se lá entro de dois em dois meses já é muito. Continuo a lá ir porque não sou gajo para mandar à merda os amigos e porque ultimamente o negócio corre mal ao Ferro, e o Pastor está doente.

Nem é por causa das recordações que evito lá pôr os pés. Okey, eu sei que é uma merda um gajo lembrar-se de andar ao soco e à facada, dia sim dia sim, e de a bebedeira ser num tipo um estado crónico, mas não é por isso.

É porque aquela porra já nada me diz. Foda-se, estou farto de chulos, putas, vadios, gatunos, traficantes, assassinos, e é só isso. Acho que é compreensível e que o Ferro não me leva a mal, por eu me cortar em ir à casa onde ele me ajudou a aprender a atacar os meus sapatos e a não ter vergonha de as solas estarem esburacadas, antes de me passar uma fusca para as unhas e dizer que eu agora já merecia fazer parte da matilha.

É verdade que quando lá entro, não há um único melro que me levante a voz, nem sequer os putos “patrocinados” pela nike, armados em valentes de brincos e correntes de ouro à solta, a nova geração, que procura ganhar uma reputação à conta de fazerem a folha a um duro dos antigos. Não, não tenho quaisquer espigas no bar do Ferro. É que, em primeiros, eu agora porto-me sempre bem e nunca mais lá me voltei a embebedar; em segundos, estão lá o Ferro, o Olívio e o Pastor, o Maine ainda vai aparecendo, e há sempre mais uns quantos primos obscuros e semi-afastados à mão de semear, só para o caso, e o resto da maralha sabe que eu faço parte do grupo dos cães danados, apesar de não o parecer.

Sou uma espécie de menino bonito do grupo dos veteranos, uma espécie de talismã para aqueles gajos, rudes, incultos e maus, mas para quem coisas como honra e amizade não são palavras vãs. É que temos entre nós um código, um código que remonta há uns oito, nove anos atrás.

E sou muito amigo dos quatro apesar de só ser íntimo mesmo do Ferro e do Olívio e de, com o Maine, uma vez quase ter chegado a vias de facto por causa de saias. A vaca da Sónia.

O Pastor é um caso à parte. No grupo é o gajo que mais respeitamos. O Pastor é raro até a falar. Quando fala, abaixamos todos as orelhas. Até o Ferro, que é o dono da casa.

O Pastor foi de todos sempre o mais pacífico, o que nem de longe nem de perto constitui cartão de visita recomendável. Porque quando o Pastor se passa, não é como eu ou como o Maine. Até já tenho pensado que, no dia em que o Pastor morrer, deveremos mandar gravar na sua lápide: “Aqui jaz o Pastor. Uma espécie de António Aleixo do banditismo, nunca fez mal a ninguém, desde que ninguém lhe fizesse mal a ele.”

A coisa é que hoje em dia temos pouco para dizer uns aos outros; eles continuaram criminosos e eu que só o fui por necessidade extrema deixei de o ser há long, long time, e dou graças a Deus, a nosso senhor Jesus Cristo, a nossa senhora sua Mãe e ao Patriarca Miguel, todos os dias. E, por isso e mais algumas merdas que fiz e já esqueci, vou cada vez menos ao bar do Ferro.

Mas, no Domingo vou lá estar outra vez.

Ainda há uns 10 minutos recebi a esse propósito um telefonema do Olívio. O cabrão do Olívio não me falava há uns bons três meses, desde que fomos jantar juntos, e a única coisa que disse, foi: “No Domingo, não te baldas, pois não?” O sacana nem me deu tempo para responder. Se calhar, estava a ligar do telemóvel e não me quis causar sarilhos. Ou na volta não. É mesmo uma onda à Olívio.

Para perceberem melhor a onda do Olívio, atentem no seguinte episódio: Há coisa duns dois anos, não via o Olívio fazia pelo menos seis meses, vou muito bem a descer a Almirante Reis, todo lindo, barbinha feita, cabelinho à pente dois e vaidoso que até metia nojo no casaco de cabedal que a minha gaja da altura me tinha oferecido, dou de caras com o Olívio, à porta da Portugália. Como se nos tivéssemos separado no dia anterior, nem me estendeu o bacalhau, pôs-me a patorra peluda no ombro e disse: “Anda, tava à tua espera, bora beber um copo.” E fomos.

Quando há bocado me ligou, não me causou estranheza nenhuma. Já estava à espera duma cena dessas ou parecida. A bem dizer, telefonassem-me ou não até já tinha comprado um tabuleiro e umas pedras de xadrez que me levaram uma porção bestial do meu orçamento, o qual nada tem nada a ver com o que era noutros tempos, vicissitudes de me ter me ter feito honesto, mas gastei essa guita e sem remorsos por dois belos motivos; em parte, para não fazer feio; e em parte, porque sempre me deu um gozo bestial quando o Ferro arreganha a tacha e me diz, aqueles olhos azuis a faiscar: “Ah, grande Lobo, sabes bem que só jogo às damas!..”

É que, sabem, no Domingo é o aniversário do Ferro e por uma data de razões que não valia a pena estar aqui a enunciar, essa é uma ocasião que não perdia por nada deste mundo. Por nada deste, ou de outro mundo qualquer.

A Rosa... e o Mundo



– Vou Dar-lhe uma Rosa.

– Vais dar-lhe uma rosa? Essa agora, porquê?

– Porque ela me agrada.

– Agrada-te? E como é que sabes isso?

– Não te sei explicar. Sei que me agrada.

– Mas tu conhece-la? O que é que sabes acerca dela?

– Sei o que sei e o que sei chega para te dizer que me agrada.

– Não te percebo. Explica-me lá isso de maneira que eu entenda.

– Ela agrada-me porque sente, é esperta e gosta de criar. É bonita.

– Hmmmm... E não tens vergonha?

– Vergonha do quê?

– Ora, vergonha de lhe dares um rosa assim, aqui no meio do recreio, com os outros meninos e meninas a verem...

– Não, não tenho. O que eu tenho é medo.

– Tens medo? Tu? Do quê?

– Tenho medo de que não goste do que trago para lhe dar.

– Não tenhas medo, vai gostar, descansa.

– Achas mesmo, tens a certeza?

– Não acho, tenho mesmo a certeza. Só há uma coisa que estás a fazer mal.

– O que é? Diz-me!..

– Se ela é como eu penso que é, merece muito mais do que uma rosa. Merece mais e não é só com uma rosa que tu lhe vais agradar a ela...

– Sim. Tens toda a razão.

– E então, o que vais fazer?

– Olha, hoje vou dar-lhe uma rosa. Amanhã, se ela quiser, dou-lhe o Mundo.

12.12.06

Pensamento da noite

"I'm about caring, I'm about people, and I'm about entertaining people. I'm a family man. A husband. A father. I've been a lot of other things over the years, which we don't really want to talk about. I'm always working on trying to better myself, you know? I think that that is an ongoing thing with me. I think I'll do that for the rest of my life. I'm always thinking of what I can do today to better my life."
Ozzy Osbourne

Pensamento do dia



"Gooooooood Mooooorniiiing, Vietnam!"


Aqui,

11.12.06

Lucy in the Sky with Diamonds



Numa noite de 1989 entrou no Bairro do Lagarteiro, no Porto, um jovem em busca de haxixe. Não havia ganza no bairro e era já a terceira noite consecutiva em que não havia. O dealer do jovem sugeriu-lhe então que levasse um pacotinho de heroína. Explicou-lhe como aquilo se fumava na prata e até lhe fiou o pacote, dizendo-lhe que se não gostasse não precisava de o pagar.

Esse rapaz, era eu.

Adorei a minha primeira moca. Foi, literalmente, fantástico; a sensação de paz interior, de leveza física, de lucidez intelectual, de clarividência, que a minha primeira heroína me proporcionou, é algo que permanece, tantos anos depois, gravado a caramelo quente neste humilde cérebro.

Foi apenas o princípio de uma longa odisseia, ou descida aos infernos, como quiserem chamar-lhe. Nos primeiros tempos, fumava apenas um pacote por semana (nas noites de quinta-feira, com Tom Waits na aparelhagem, o ritual perfeito). Ao fim de um mês, passei a fumar duas vezes por semana. No segundo mês, o dealer tinha uma barganha para mim: um pacotão de cinco gramas de grande qualidade e a preço reduzido. A partir daí, passei a consumir todos os dias.

Na altura, tinha um emprego bonito, estava a acabar o meu primeiro curso e tinha entrado para os quadros dum jornal importante. Em menos de três anos consegui realizar a proeza de ser despedido, apesar de toda a gente considerar que era um jornalista promissor; chegara a trabalhar 16 horas por dia sem ganhar um tostão extra: fazia-o por Amor ao Jornalismo. No entanto, fui convidado a sair porque a minha vida secreta tinha deixado de o ser.

Virei costas ao Porto e regressei a casa dos meus pais. Eu era bom a enganá-los (ou seriam eles que não queriam acreditar nos indícios que se iam acumulando) e para além de vários empregos de merda que sustentavam o vício até arranjei uma namorada que mais tarde veio a ser a minha primeira mulher.

Nesse tempo, a minha rotina era muito simples: precisava só de um conto por dia para comprar o meu pacote. Vá, cinco contos quando queria um risco de coca. Conduzia camiões, fazia de locutor numa rádio local, vendia terrenos, o que fosse preciso. E, como regra geral só fumava um discreto pacote diário, lograva ocultar dos outros o meu vício e até convencer-me a mim próprio de que tinha o assunto sob controlo.
Em 1994, a sorte que eu tantas vezes desprezei ao longo da vida voltou a sorrir-me. Arranjei um emprego bem remunerado (350 contos limpos por mês mais carro para uso total) e mudei-me com a minha mulher, entretanto tínhamos casado, para uma casa que alugámos na Lapa.

Ela sabia que eu me drogava mas na sua inocência acreditou que me poderia mudar, ou se calhar pensou que mil paus por dia não era assim tão grave. Sinceramente, não sei. E nunca o saberei visto ela ter falecido num estúpido acidente de moto já depois de nos termos divorciado. Sei que estava completamente louca, absolutamente deslumbrada por mim e tenho muita pena de não ter tido a hipótese de lhe pedir desculpa.

Quando viemos para Lisboa passei a frequentar o Casal Ventoso. Vocês não podem imaginar o que era o Casal nos meados da década de noventa. Era preciso lá ter estado. Por dia, afluíam ao “super-mercado de droga da Europa”, milhares e milhares (sim, leram bem) de consumidores. Milhares e milhares de contos mudavam de mãos todos os dias.

No Casal havia de tudo. Desde pessoas completamente nas últimas, farrapos humanos, até gajos de fato Armani e gravata de seda, como eu. Até havia polícias envergonhados na bicha do cavalo.

E pregões: “Olha ó pó da Porta Verde!” “Castanha e Branca, a melhor é a do Velho!” “Compras duas quartas e levas uma de borla na Porta Amarela!”. Assim, à luz do dia, sem falsos pudores nem cá tretas de “esconde aí essa cena porque tás a ver é uma cena que ninguém pode saber”. Não, tudo se passava às claras, paredes meias com a Avenida de Ceuta, paredes meias com uma cidade a abarrotar de hipocrisia e onde o cavaquismo agonizava, felizmente, como numa feira de domingo muito concorrida, onde a única diferença residia no facto de que aquilo que se vendia, pois – matava. E não matava tão poucos quanto isso. “Mortalhas, seringas, amoníaco, prata, limões!”

À medida que o tempo passava os meus hábitos de consumo foram-se alterando. Um pacote já não me chegava: precisava pelo menos de uma quarta de grama por dia; isso dava-me sensivelmente cinco fumos: um ao acordar, ainda antes do pequeno almoço, outro a seguir, um depois de almoço, outro à tarde e finalmente um, quando vinha bem aviado dois, à noite.

Como devem calcular, a primeira coisa a ressentir-se foi o meu casamento. Por dois motivos: o dinheiro começou a escassear cada vez mais e eu não fazia amor com a minha mulher (é, a heroína corta completamente a tesão). A segunda foi o meu emprego. Como é que um gajo podia trabalhar se passava o dia enfiado no Casal Ventoso?

Mas eu era bom a enganar os outros e parecia ter um sexto sentido que me avisava quando tinha de ir trabalhar. Sendo delegado de Informação Médica tinha ampla liberdade de movimentos e não me era muito difícil falsificar os relatórios das visitas que supostamente efectuava. E o meu sexto sentido avisava-me sempre dos dias em que os meus chefes apareciam de surpresa nos hospitais a confirmar se eu realmente lá estava.

A coisa foi-se arrastando, arrastando nesta miséria, de mal a pior. Corria o ano de 1999 e o Casal estava prestes a ir abaixo. Tornava-se cada vez mais difícil encontrar droga e muitas vezes quando se encontrava não valia um caralho. A despesa com o pó subia astronomicamente para os 10, 15, 20 contos por dia. A economia doméstica entrara numa espiral de pedidos de crédito atrás de pedidos de crédito e a Conceição estava cada vez mais desesperada.

Entretanto, para dilatar a moca, passara a meter também valiums e reupnois. Como isso me dava sono, para contrabalançar metia ainda anfetaminas e fumava bases de coca. À pala disso, em dois anos tive perto de 20 acidentes de automóvel. A sorte, o acaso, Deus, seja lá o que for, tirou-me de todos eles sem um arranhão.
Nem sei como é que os gajos da empresa toleraram essa situação durante todo esse tempo, afinal eram os prémios de seguro deles que subiam em flecha e penso que se estivesse no lugar deles teria chegado à conclusão de que um gajo que tinha um coeficiente de acidentes tão alto apresentava problemas graves, muito graves. Mas não o fizeram.

Afinal, no princípio do Verão de 1999, tudo chegou ao fim. A Conceição deixou-me, o emprego perdi-o, o senhorio da casa mudou-me as chaves da fechadura e passei a viver num carro que entretanto tinha adquirido, ainda a crédito.
Aguentei assim durante umas três semanas. Dormia no carro e durante o dia fazia “serviços” de taxi mais baratos a outros drogados.

No dia 23 de Junho de 1999, estava eu a fazer a barba numa casa de banho do centro comercial Colombo e no espelho aquela cara que não reconheci disse-me que só tinha duas opções: ou o pó me matava ou eu matava o pó.

Nesse dia, empenhei os meus documentos por gasolina e arranquei para a costa da Arrábida. Tinha duas paletes de downers e passei os três dias seguintes a dormir. Depois, acabaram os comprimidos e veio a ressaca. Já era magro mas na ressaca ainda perdi uns bons dez quilos: diarreia; desidratação; centro de saúde. Sem documentos. Uma médica que me olhou como se tivesse lepra e me receitou coca-cola sem gás, arroz carolino sem refugados. E foi assim um esqueleto humano aquele que se apresentou em casa dos pais a pedir ajuda.

O meu pai mandou-me foder, sem contemplações, mas não lhe levo a mal por isso. O meu pai é médico e sabe que não se pode confiar num tóxico, até porque ele já intentara ajudar-me por mais de uma vez e eu o enganara. Como é que ele podia saber que desta vez era a sério? Amo-te pai, amo-te muito.

Já a minha mãe, porque é mãe, agarrou-se ao telefone e passou o dia a telefonar a familiares e amigos a ver se alguém me podia acolher. Todos se cortaram. Todos. Até um cabrão que foi criado comigo e que me devia respeito.

A salvação chegou de onde menos se esperava. O meu meio irmão Pedro, que não via pelo menos há uns 10 anos e de quem nunca tinha sido íntimo, aceitou falar comigo.
A minha mãe levou-me a Lisboa e o meu irmão estava à nossa espera na rua Castilho. Entrei no carro dele e a chorar contei-lhe tudo. Disse-lhe que queria mesmo mudar mas que precisava no mínimo dum tecto e de comida.

Escutou-me e então falou. Nunca mais me esqueci da maneira como me olhou, dos seus olhos tão parecidos com os do nosso pai, e da sua voz brusca, a voz de alguém que sabe que está a correr um risco enorme, quando me disse, secamente: “Vai dizer adeus à tua mãe, vens para minha casa.”

O Pedro chateou-se com a mulher para me receber no apartamento deles. Ouvi-os discutir enquanto eu esperava na sala e senti-me mal, muito mal. Mas quando voltaram do quarto ela trazia para mim um sorriso lindo, um sorriso lindo como poucas vezes me voltaram a oferecer. E, nas semanas seguintes, todos eles, o Pedro tinha dois filhos (digo tinha porque agora são três) deram-me aquilo de que eu mais precisava: a sua confiança e o seu amor incondicional.
...........................................

Faz sete anos que estou limpo. Desde então, todos os dias 23 de Junho, cumpro um ritual elaborado que passa por relembrar o passado e tentar ser mais justo comigo e com os outros. Aos poucos, refiz a minha vida. A pulso. Não julguem que tem sido uma brincadeira de crianças. Mas refiz a minha vida e não devo dinheiro ou satisfações a ninguém. Sou um homem livre.

No momento em que vos escrevo e apesar de no princípio deste ano me ter separado da única mulher que realmente amei e se calhar ainda amo, sinto-me forte, sinto-me capaz, sinto-me lúcido e dou cartas naquilo que faço. É que possuo uma garra de viver que nem imaginam. Nem sonham.

Tudo isto vem a propósito de um texto que li – da autoria de um amigo do meu melhor amigo – e que me perturbou, se calhar sem razões para isso, mas ao ler esse texto foi como se me visse ao espelho, quando tinha vinte anos. Foi como se visse como eu fui, um jovem talentoso a começar uma bonita carreira, como eu fui, um jovem seguro de si que achava piada em tomar umas drogas e em dizê-lo ao Mundo sem meias medidas.

O autor dava conta dos prazeres de tomar LSD. Tem uma certo humor macabro, é das poucas drogas que nunca meti, mas isso não vem para o caso. O que vem para o caso é que não meti mas podia ter metido. LSD, Coca, Heroa, ao fim e ao cabo não é tudo farinha do mesmo saco?

Só lhe quero dizer mais uma coisa. Sei que sou um paternalista do caralho, mas não sou um falso moralista, não acredito em milagres e não sou um hipócrita; bebo os meus copos e fumo as minhas ganzas, nem mais, nem menos. Contudo, heroína não voltou a entrar neste organismo e LSD penso que nunca entrará; nem este tipo imperfeito voltou a ser um dependente, do pó ou seja lá do que for. Como disse, sou um homem livre que ama a Liberdade. E pago o preço que for preciso. Não tenho medo. Se quiserem, viciei-me em ser livre. Assim sendo – meus amigos – se o que desejam é drogarem-se, então, droguem-se.

Estejam é bem cientes dos riscos em que incorrem.

10.12.06

Pensamento da tarde



"I wanted to see exotic Vietnam... the crown jewel of Southeast Asia. I wanted to meet interesting and stimulating people of an ancient culture... and kill them."


Sergeant "Joker" in Full Metal Jacket.



Aqui, música para pensar

Um homem normal


Havia já alguns meses que este seu hobby se estendia. Tratava-se de algo que o preenchia, como nunca nada o fizera. Nem a mulher, nem os filhos, nem mesmo a sua preciosa colecção de selos. Era, para si, a melhor forma de libertar a carga de stress de mais uma horrivel semana de trabalho nos Correios, de descomprimir, mandar o mundo dar uma curva. Era a única maneira que tinha de, todas as manhãs, ver o espelho retribuir o sorriso. Diga-se de passagem, era o seu desporto. Caçar. De vez em quando, gostava de sair à rua, submergido na noite escura e tortuosa, e libertar-se, matando. Tirando mais uma vida.

Sentira o particular viciante gosto da morte há alguns meses atrás, depois de uma rixa num bar. O dia correra mal (para não variar) e o seu humor há já uns tempos que não era dos melhores. Falava-se em despedimentos, em cortar no excesso de pessoal, e as dívidas acumulavam-se: casa, carro, o colégio dos miúdos, tanta coisa! Sabia que seria só uma questão de tempo até lhe saltar a tampa, até se passar de vez.
Embora provocado até à exaustão por um tipo com demasiada cerveja em cima, não respondeu a nenhuma das suas provocações. Não desferiu um único golpe, nem mesmo depois de se levantar do chão, após o cretino o agredir. Não. Esperou calmamente, perna cruzada, olhar perdido, saboreou ociosamente o seu whisky, fumou o seu cigarro em passas longas e demoradas, brincando com o fumo. Observou as mulheres que entravam, sempre silencioso, sempre discreto. Esperou... Finalmente, o bebedolas fora expulso do bar (depois de se meter com mais uma mulher) e, cambaleando e cantando, desceu a rua, sem pressas, ao ritmo do assobio. Foi então que, lentamente, se levantou da cadeira, pagou o que devia, deixou uma escassa gorjeta, e saiu porta fora, a passo lento, atrás do tratante. Observava-o com desprezo enquanto o seguia rua abaixo e, nesse momento, percebeu o prazer que lhe dava aquele acto em particular. Sentiu-se poderoso, dominante! O tigre a observar a presa indefesa, inconsciente do que lhe espera. O coração corria velozmente como se fosse sair disparado do peito, o sangue corria mais depressa, fervendo, queimando-lhe a pele, os sentidos aguçavam-se. Soube, então, qual o sentido da sua vida. E, na posse deste conhecimento revelador e pacificante, acelerou o passo, à medida que o sangue corria cada vez mais rápido, olhos brilhantes de excitação, o coração explodia no peito em pura antecipação!
Assim que o apanhou numa rua escura e deserta na fria madrugada, golpeou-o fortemente na cabeca com uma garrafa. O sangue manchou a rua de vermelho, o urro da vítima ecoou na noite tenebrosa despertando ainda mais os instintos animalescos do atacante. Soco após soco, um pontapé atrás do outro, partindo ossos, rasgando a carne, desfigurando-o, sentiu o calor da vida como nunca o sentira até então, no seu auge: a morte. Cheirou o medo. Sentiu o calor tranquilizante do último sopro do homem, misturado subtilmente com o fedor do álcool. Mas, era outro cheiro, novo. Sabia no mais profundo íntimo do seu ser que só podia ser o odor da Morte, presente naquele acto macabro, mas tão profundamente libertador.

Depois, os gritos cessaram, o silêncio desceu pesadamente sobre as ruas misturando-se com o denso nevoeiro, a chuva caía, tristemente, limpando o pecado. O furor passou, os olhos voltaram a ficar vazios, sem brilho, sem cor. O coração voltara a bater vagarosamente. Como era possível que batesse tão devagar agora? Mas, algo tinha mudado. Sentia paz, tranquilidade, alegria.
E voltou para casa, feliz, satisfeito. No dia segunite, beijou a mulher como há muito não fazia e brincou com os filhos, como se não houvesse nada mais no mundo. A consciência da Morte mostrara-lhe a fragilidade da Vida.

A frustração desaparecera... por umas semanas...
Obviamente, com o tempo, tornara-se mais refinado. Como em qualquer desporto que se pratica afincadamente, há progresso. Ganhara um carinho especial por lâminas; e por mulheres. Nada de sexual, a sua mulher era tudo para ele. Mas havia um je ne sais quoi na voz estridente de uma mulher, nos seus pedidos de misericórdia, nas suas lágrimas de medo e desespero, no rosto petrificado, que lhe proporcionavam um prazer incomparável!

Agora, está na hora do seu passatempo. A meia-noite aproxima-se, aquele calafrio já familiar mas sempre novo apodera-se do seu espírito. Viciado na loucura, no sabor da morte que nunca mais esqueceu, sabe que não ficará satisfeito enquanto não matar outra vez. O derradeiro acto. Elege a arma para esta noite (no método só pensará na hora), calça as luvas e dirige-se calmamente para a porta. Ao ecoar de cada passo, o coração volta a bater velozmente, o sangue ferve, borbulhante, nas veias, os olhos brilham, excitados. A luxuriante e incomparável possessão da Morte regressa, materna e caridosa. Roda o manípulo e sai para a rua. Está na hora...
Título por: Lobo Solitário

Pensamento da madrugada



"When I played drunks I had to remain sober because I didn't know how to play them when I was drunk."


Richard Burton

O rival de sempre



Tudo estava bem encaminhado. Havia sido um árduo caminho até chegar aonde chegara. Mas agora tinha finalmente motivos para sorrir, e para seu próprio espanto não eram motivos egoístas ou cínicos, bem pelo contrário, eram motivos de alegria e de felicidade.

Começara como um brincadeira para matar o tempo, uma brincadeira inocente, porque já não suportava os amigos e a família a repetirem-lhe sempre e sempre a mesma ladainha. Estava farto do silêncio pesado aos domingos, em casa dos pais, sempre que a conversa esmorecia em torno da sua vida e do que iria fazer, agora que passara já um ano desde que Margareth falecera. E estava obstinado em queimar da sua vida uma palavra que passara a abominar desde que M nos deixara; a palavra “sempre”.

Estava também farto das esquivas dos amigos, sempre que se sentia cansado de estar em casa sozinho e lhes telefonava a perguntar se queriam ir beber um copo. Invariavelmente, sempre se escusavam de uma maneira mais ou menos delicada.

Ás vezes, até lhe parecia que tinha sarna e tinha vontade de os mandar a todos a um certo sítio. Depois, com calma, percebia que os amigos eram casados e não podiam pura e simplesmente mandar filhos e mulher para casa dos sogros só para irem beber copos e jogar poker com ele. E quando algum dos velhos comparsas o convidava para jantar, acabava sempre por se sentir como a roda suplente na linha do comboio da amena cavaqueira que se estabelecia entre os vários casais à roda do assado ou do rosbife.

Como passara a detestar os olhares compungidos com que, já depois da sobremesa, whiskies e brandies servidos, as mulheres dos amigos o brindavam! Odiava-as por isso e chegou até a contemplar a hipótese de aliciar algumas, e sabe Deus que umas poucas pareciam mesmo estar a pedi-lo. Mas nunca o fez. Julian sempre fora leal com os amigos, os amigos eram-lhe sagrados. Eram amigos e ponto final. Aí, não detestava a palavra sempre. A seu ver, um amigo era para sempre e ele sempre seria amigo do seu amigo. Sempre.

E assim, um pouco por diversão, um pouco porque não tinha nada melhor para fazer e por que se aborrecia de morte desde que ficara viúvo, resolveu que iria encantar aquela figura que, por mero acaso, surgira na sua vida, num jantar em casa dos pais. Chamava-se Angie, como na canção. Era bonita e subtil e parecia deslocada no ambiente luso-britânico da casa dos pais. Não deu à mãe a satisfação de lhe perguntar quem era aquela pêssega, mais sabia ele que a mãe decerto a convidara tendo-o a si em consideração. Não, não lhe deu essa satisfação, mas Angie agradou-lhe. Era algo que não podia definir mas que lhe agradava e resolver dedicar-se-lhe.

De certo modo, fazê-lo era também uma maneira de escapar ao fatalismo que o perseguia. De certo modo, acho que fazê-lo era uma maneira de Julian escapar à palavra que mais detestava, mesmo nos tempos em que a doença ainda não minara totalmente a sua relação com Margareth; a palavra “sempre”.

E agora ali estava ele, excitado com a surpresa que a vida achara finalmente por bem oferecer-lhe. A princípio tinha sido apenas e só um jogo. É claro que no seu íntimo também desejava saber se ainda possuía aquele poder que os seus antigos colegas da faculdade (entre os quais me incluo) sempre, sempre lhe haviam invejado.

Se ainda tinha dentro dele a capacidade de seduzir uma mulher. Não de seduzir uma criança, essas sempre lhe tinham sido fáceis em demasia. Mas seduzir a uma mulher. De seduzir a uma mulher que estivesse ao seu nível e que lhe desse luta. Uma mulher que não fosse em meias cantigas ou em palavras baratas. Uma mulher a sério. Uma mulher que lhe exigisse tudo e a quem ele em troca também tudo pudesse exigir.

E pensar que tudo começara como uma brincadeira! Dois meses depois e muitas horas na companhia dela, ali estava ele, como se fosse um colegial, suspenso das suas palavras, dos seus gestos, das suas brincadeiras, do seu jeito de o fazer sentir-se completo como nunca se sentira antes. Ali estava ele, a telefonar todas as noites ao seu melhor amigo, que vivia na outra ponta do país, ao seu melhor amigo que tinha coisas sérias em que pensar, maçando-o madrugada fora com os relatos da beleza dela, da astúcia dela, das fraquezas dela que a seus olhos só a tornavam mais encantadora, mais charmosa, mais tudo, mais ainda tudo do que como fora com Margareth!

…………………………………...

Naquele sábado telefonou-me outra vez eram três da manhã e eu estava muito cansado, mas como o Julian sempre foi meu amigo, resolvi escutá-lo, nem que fosse porque a um amigo não se nega nada. A história que me relatou não a acreditei então mas fui forçado a acreditá-la na manhã seguinte.

Surpreendera-a a beijar outro melro. Senti no calor das suas palavras que tinha bebido. E muito. Mas parecia perigosamente lúcido. Disse-me que sempre a vida o tratara assim. Primeiro, quando o cancro lhe roubara a avó, a mulher que o criara quando os pais tinham ido ganhar a vida em Inglaterra. Depois, quando outra doença que os médicos nunca haviam definido lhe roubara Margareth. Mas agora, assegurou-me friamente, o feitiço ia virar-se contra o feiticeiro.

O rival de sempre não lhe ia roubar Angie, nem pensar, ia ele roubar o rival. Ele encarregar-se-ia disso. Meio estremunhado, não percebi o que me queria dizer. Afinal, quem era o rival, questionei-o. Disse que o rival era o de sempre mas que desta vez quem se ficaria a rir era ele e não o rival. Não percebi e disse-lhe para ter juízo. Recomendei que se fosse deitar, pois era já muito tarde e no dia seguinte falaríamos.

No dia seguinte, o jornal contou-me o resto da história: Julian estava preso. Tinha-os morto a ambos. A Angie e a um tipo chamado Paul. Chamado Paul Always.

9.12.06

Memorias lluviosas



Me acuerdo de todo como se fuera hoy. Pero sucede que han pasado más de veinte años. Me acuerdo de su voz, melodiosa, como la de algunos pasaros que escucho en el balcón. Mientras, escribo, pintando, en los reflejos de la reminiscencia de sus ojos, la acuarela de su aparición borrascosa. Una evocación singular que se impone en mi espíritu. Cada vez más fuerte, urgente, suplicante. Por la mañana, me acuerdo de las palabras, del gesto, del aire, del mar. Entonces, mi cabeza es como la espuma del tiempo, llena de memorias lluviosas, de una decoloración lancinante.
Hace más de veinte años: ¿Por qué no la olvidé? Tanto tiempo ha pasado y la Remembranza permanece tan pura como ayer, tan cristalina como el correr negro de la tinta en el papel blanco. Escribo y hace sol la fuera y los pasaros cantan, nidifican. Estás aquí y de nuevo te veo, mirándome mientras escribo. Nuestras vidas paralelas se escaparan para siempre en el grande océano de la vida. Como dos granos de arena nos perdimos y jamás nos volveremos a encontrar en ese arenal más vasto que es el amor. Se así es, ¿Por qué no te olvidé?
Era el verano. La playa con su descubierta tremenda de los sentidos. La inocencia de un amor violento. Un continente desconocido de emociones raras y feroces. Quizá en todos los hombres existe una mujer así. Una de aquellas pocas que se quedan para siempre en nuestra memoria. Se llamaba Juana y tenía los ojos más azules que hubiera visto. No sé que pasó conmigo cuando la conocí. Tan poco lo que pasa ahora. Fue la chica más guapa que se cruzó con mi vida. Pasaran más de veinte años, pero me acuerdo de todo como se fuera hoy.

A carícia, sim ou não?


O seguinte texto é da autoria da Borboleta Assanhada e recolhi-o dos SNA.

"Hoje vai ser diferente...

Hoje quero que me faças uma coisa diferente. Hoje quero que me comas o cu. É inédito nas nossas fodas...aceitas?

Claro... Vais ver que é tão bom como o resto. Desde que bem feito...

Olha-me, faz-me o que quiseres, mas não magoes... Sabe bem acariciares-me assim as nádegas. Beija-me, apalpa-me. Eu brindo-te com a minha descontracção.

Põe uma almofada debaixo da barriga, alça-me esse cu!! Gosto de te fazer isto, ver a tua reacção à minha lingua...bem húmida., a salivar, para que fiques com ele bem molhado, enquanto te seguro as nádegas. Gosto de passear o meu dedo nestas pequenas pregas, enquanto a minha saliva continua a regar este olho que teima em voltar as costas ao mundo. Ameaça abrir, quando te descontrais mais. Tu tocas-te...faz isso, sim. A minha língua é tua amiga e força uma entrada nada difícil, pois estás a gostar...muito. E tocas-te.

Arrisca...enfia-me esse dedo...isso. Foda-se, sabe bem...continua assim, a entrar, a sair...isso. Os teus dedos famintos brincam para ver quem entra e sai mais depressa.

O que eu não faço para te agradar. Toca-te, só te posso dar conta do cuzinho...tu dás conta do resto. Nunca imaginei estar assim, a foder-te o cu com dois dedos e tu, a gemer e a pedires mais...

Não pares...estou quase a vir-me... Que pena não ter sido para a tua boca...minha putinha...

O que eu não faço para te agradar, meu cabrão...até te fodo o cu com os dedos... "

Ida ao dentista



Hoje acordei só.

Acordei com a alma negra e suja
Como o carvão.

Com o cérebro em chispe de feijoada
D’absinto.

Com sentimentos de utopia, palavras d’alegria
Como a Liberdade.

Com o rei da rosa submerso no Mar
Dos espinhos.

Com promessas perdidas no regaço da dor
Como o Amor.

Com os olhos D’Ásia através das oliveiras
Do Tempo.

Com segredos e mentiras num peixe da Lua
Como a Loucura.

Com uma certa fadiga, inquieto rebelde
Do excesso.

Com o azul infinito dos teus olhos
Como o diabo.

Com um cigarro amarelado de medo
Da morte.

Como as folhas de Outono a cair
Como a Vida.

Hoje acordei só.
E, pior do que tudo,

Com uma execrável dor de dentes!

Pensamento da noite


And, by the way, I say this guy, because I firmly believe, looking at these results, that if there is a God, it has to be a man.
No woman could or would ever fuck things up like this.
If there is a God, if there is, I think most reasonable people might agree that he’s at least incompetent and maybe, just maybe, doesn’t give a shit.

George Carlin

8.12.06

Pensamento da tarde



E façam o favor de ouvir isto:

Escolhas difíceis


São agora dez da noite de um chuvoso e negro dia de Janeiro. Carlos conduz furiosamente estrada fora, amaldiçoando a sua sorte a cada metro. A vida até lhe corria bem. Aliás, nunca correra melhor! Então, porque tinha que se meter em enrascadas destas? Tinha um casamento estável, um bom emprego na empresa do sogro e uma esposa leal e dedicada. O futuro garantido. O que mais podia pedir? Como sempre, Carlos agira por impulso em vez de usar a cabeça. Se pelo menos pudesse voltar atrás, nunca se teria envolvido com ela, poupando-se agora a uma das decisões mais difíceis da sua vida.

Carlos conhecera Madalena numa galeria de arte. Não que fosse propriamente um artista, nem sequer um entendido. Um simples apreciador, de cores, linhas, sentimentos, fantasias alheias. Já Madalena estava a tirar o doutoramento em arte. Encontraram-se por acaso, ao contemplarem lado a lado o mesmo quadro de um qualquer artista. Madalena era esbelta. O seu rosto transmitia paz e tranquilidade, mesmo sob a capa de concentração. Os olhos negros estudavam atentamente o quadro, e o cabelo liso e longo apanhado atrás revelava o seu pescoço delicadamente esculpido. Era uma beleza diferente, de atenção, de pormenor. Carlos reparara na elegante mulher e logo soltou um comentário acerca do quadro. Madalena, escondida por um discreto sorriso, apressou-se a corrigi-lo... de forma educada e cortês, claro está. Seguiu-se o convite para uma bebida, o qual ela hesitantemente aceitou. O resto é história: apaixonaram-se (mais ela por ele do que ele por ela), casaram-se e a vida de Carlos logo começou a endireitar-se. O sogro, bem na vida, dono de uma empresa, reconheceu o potencial de Carlos, e prontamente ofereceu-lhe um emprego. Carlos não era um encostado! Pelo contrário, o sogro fizera sempre questão em tratá-lo como um empregado comum e, se ocupava a posição que ocupava naquela empresa, foi porque trabalhou e subiu a pulso. Toda a sua vida trabalhara duro para sobreviver, para ajudar uma mãe doente e uma família de mais dois irmãos, abandonados pelo bêbedo do pai. Agora, tinha a vida pela qual sempre lutara. A vida à qual tinha direito. No entanto, duvidava muito que o seu benfeitor continuasse a tratá-lo justamente se abandonasse a sua “jóia mais preciosa” por outra mulher.
Foi num jantar entre amigos que Carlos conheceu Joana, a melhor amiga de Madalena. Joana distinguia-se entre a multidão pela sua voluptuosidade de movimentos e rosto angélico, mas convidativo. As madeixas de cabelo castanho desciam-lhe gentilmente pelo rosto, escondendo de igual forma gentil os ombros delicados já cobertos pela alsa do vestido negro. Os olhos avelã perscrutavam, entediados e altivos, todos os convidados, e os lábios sedosos bebericavam casualmente a bebida. Estava claramente deslocada dos outros amigos de Madalena. Também Carlos julgava os amigos desta extremamente desinteressantes (até arrogantes), pelo que, com a maior das naturalidades (e sem qualquer intenção maliciosa), meteu conversa com a jovem solitária. Mas, o resto é história: no dia seguinte é um café, depois um flirt inocente, uma conversa prolongada e mais profunda, uma partilha de desejos e ambições e, quando se dá por ela, está-se apanhadinho por quem não se deve.
Carlos era esperto. Durante meses conseguiu manter esta dupla vida. Madalena não suspeitava. De certa forma, Carlos sentia remorsos por enganá-la, tão pura no seu sentimento. O que nutria por Joana, porém, ja há muito que passara a simples aventura. Com certeza, Carlos podia dizer que estava verdadeiramente apaixonado. Madalena era inteligente, dedicada e carinhosa. Carlos tinha por ela, apesar de tudo, carinho e a maior estima. Joana, por outro lado, era perspicaz, determinada (talvez um pouco teimosa) e confiante. O que Carlos sentia por ela consumia todas as horas do dia de todos os dias.

Estava consciente de que chegaria o dia em que teria que escolher. Ela obrigou-o a escolher. Carlos prometera-lhe que deixaria a mulher em breve, mas nunca teve coragem. Joana decidira fazê-lo por ele. Iria falar abertamente com Madalena e pôr um ponto final a tudo. Joana era, também, vingativa. Carlos sabia que, se não a escolhesse, esta agiria pelo puro impulso da rejeição.

Tinha agora que escolher: por um lado, tinha a vida confortável e o excelente emprego na empresa do sogro que o casamento com Madalena proporcionava. Não a amava como desejava, mas era mulher com quem passar o resto da vida. Por outro, se ficasse com Joana, a mulher por quem nunca sentira nada igual, teria que voltar à luta, aos empregos medíocres, ao constante apertar o cinto.

Carlos escolheu. São agora dez e meia da noite de um chuvoso e negro dia de Janeiro. Carlos conduz furiosamente estrada fora, amaldiçoando a sua sorte a cada metro. A vida até lhe corria bem. Aliás, nunca correra melhor! Então, porque tinha que se meter em enrascadas destas? Carlos dirige-se a uma rua da casa de Joana, a rua escura por onde Joana passa sempre quando volta do trabalho. Certamente, considerando o quão perigosa é a zona onde vive, não seria surpresa se, na manhã seguinte, alguém descobrisse o seu corpo morto, jazendo no meio dos contentores. É que, sabem, às vezes há assaltos que correm mal...

Carlos ama Joana. Muito! Só ele sabe como lhe vai custar rodear o seu frágil pescoço com os seus dedos brutos, e sentir os seus suspiros, e outro… outro… outro, até libertar o último, ainda quente, sempre doce, que lhe secará os lábios sedosos. Sabe, também, que esta tornar-se-á uma memória, com o tempo... Afinal de contas, o amor não enche barriga.

E, na vida, é preciso fazer escolhas...

Pensamento da madrugada

7.12.06

Memórias dum emigrante - II

"Querida Maria

Fez ontem sete meses que trocámos à minha chegada ao aeroporto de Pedras Rubras as nossas últimas palavras e ontem como hoje elas ecoam na minha cabeça de uma forma que me assusta e ao mesmo tempo me deixa perplexo com a minha própria estupidez.

Estou a escrever-te não com o propósito de te magoar, de fazer com que te afastes ainda mais de mim, mas apenas porque tenho de te dizer o quanto estou arrependido do que fiz, das coisas que disse, das decisões idiotas, sem tino, sem qualquer nexo, que tomei em relação a nós os dois. E se não queres acreditar o melhor é fingires que não me viste que sou gajo para me passar de vez e dar-te uma lição que nunca mais iremos esquecer.

É-me difícil descrever-te como estou e a falta terrível que sinto de ti. Passo os dias a lutar com esse sentimento, oscilo entre momentos de claridade, outros de trevas, como este, outros ainda de normalidade, em que consigo fazer alguma coisa de útil, e outros em que não sinto qualquer interesse pelo que me possa suceder, pela vida que nos rodeia, por mim próprio.

No bar onde encontrei emprego e onde todos me acarinham, nem sei bem porquê, comentam que sou estranho, que há algo em mim que não bate certo, apesar de dizerem também que sou um dos melhores barmen que alguma vez ali viram trabalhar. Sei que o fazem quando estou de costas e julgam que não os estou a ouvir, mas, como sabes, os anos de tarimba que levo atrás de mim tornaram-me extremamente susceptível às bocas de colegas.

O que dizem é e não é verdade.

Ao princípio, tudo parecia lógico e fazer todo o sentido. Mas agora não. Não faz sentido algum e embora veja claramente o erro que cometi, não o consigo perceber, nem explicá-lo.

Como fui capaz de desprezar o teu amor, o teu carinho, a tua amizade, não o percebo. Como fui capaz de te magoar da forma como o fiz, também não. Não sei o que se passou.

Ao olhar para trás, parece que os últimos tempos antes do meu regresso do estrangeiro nada mais foram do que um estágio, uma espécie de uma preparação de um tipo que quer cometer o suicídio sem saber que o deseja e agora se arrepende de o ter planeado de uma forma tão exaustiva e racional.

O Robert é que tinha razão: "Robino, you got to keep your cool. Right now you're boiling and if you keep going like that you're gonna blow. Keep you're cool don't forget there are loads of women but just enough cash". Escutei o Robert e ainda o escuto e penso que o Robert tendo sido o melhor chefe que tive durante todos estes anos era também o mais imbecil.

Não posso imaginar o que passaste só em Portugal, mas não podes imaginar igualmente o que passei lá, sobretudo neste último Inverno de frio, nevoeiro, neve, chuva. Agora, tenho a certeza disso, cometi um dos maiores erros da minha vida, senão mesmo o maior.

A única coisa que desejo é ter-te nos braços, beijar o teu sorriso, aninhada no meu peito de tigre, como costumavas dizer, juntos, em harmonia. Dar-te beijos. Muitos beijos, fazer-te brilhar de novo, brincarmos juntos como dois preguiças.

Não sei bem o que possa fazer para te conquistar outra vez. Por um lado, tudo parece perdido, mas a dor que sinto impele-me a tentar e tentar de novo. Quero-te e tu dizes que já não me queres.

Os momentos que passámos juntos, revejo-os com maior nitidez do que nunca. Passo horas a fio a olhar para fotografias tuas, a estudar cada gesto teu, cada trejeito, cada momice, cada sorriso. Não te consigo esquecer Maria.

Estou arrependido. Não imaginas como estou arrependido. Sinto a tua falta como se me faltasse parte de mim. Sinto-me amputado, sinto-me incompleto, destruído. Sinto uma dor quase física ao não te ter por perto e ao sentir que não te voltarei a ter. Quero abraçar-te, Quero ter-te comigo, quero ficar contigo para sempre.

Quero dizer-te coisas lindas, quero consertar a asneira que fiz, quero que me voltes a amar, quero fazer com que sejamos felizes. Já te esqueceste do nosso sonho?

Peço-te só uma oportunidade. Juro-te que sou sincero. Preciso de ti ao meu lado. Sem ti as economias que fiz e que ainda continuo a fazer nada mais são do que papéis desvalorizados e sem qualquer sentido.

Dá-me só mais uma hipótese, imploro-te. Por favor, diz-me qualquer coisa, o que for, dá-me um sinal de que ainda posso sonhar, de que ainda posso ter esperança, de que há ainda a possibilidade de um futuro para nós.

Júlio."

Aqui, Memórias dum Emigrante - I.