6.3.09

Haircut - The reason why


Eu não tenho nada contra paneleiros e contra lésbicas menos ainda, bem pelo contrário. A última vez que cortei o cabelo ainda tinha carro, fazia sol, entrei na barbearia quinze minutos antes do fecho, perto da farmácia, fiquei lá dentro quase uma hora, entre as novidades da terra, da tesoura e da navalha e quando finalmente regressei ao carro para voltar à casa onde habitava nessa época vinha um quilo e meio mais leve e sentia-me muito bem disposto.

Os panascas querem casar. Acho que é um estupidez. Não me entra na cabeça porque é que os paneleiros ou as fufas possam querem casar, parece-me completamente idiota, não a sua orientação social, mas sim o casamento, esse contrato que se firma para todos verem: olha, eu casei com a Maria, a Maria é a minha mulher e eu sou o Manuel, um homem casado com a Maria, conosco ninguém se mete porque casámos no registo e palhas não palhas até vamos à igreja da paróquia, só para lavar os pecados na água benta do nosso santificado matrimónio.

No dia em que cortei o cabelo, antes de chegar a casa, passei pelo supermercado, comprei duas latas de salsichas, sete garrafas de cerveja, dois tomates, um pepino, quatro garrafas de vinho, cinco maços de tabaco e uma garrafa de cachaça - café não era necessário, os proprietários da casa haviam deixado para trás um stock de dimensões razoáveis.

Portanto, querem casar. Acho bem. Se toda a gente se casa, porque caralho não podem os panascas casar? A bem dizer, em que é que isso me afecta? OU nos afecta a todos nós? Reparem, o problema é deles, de quem se casa, isto é. O casamento é um contrato para inglês ou de Direito ver e, porque o casamento proporciona alguns benefícios legais, reconhecidos pela sociedade no seu todo, o casamento é uma coisa muita séria. Por exemplo, eu, quando me caso, assumo um compromisso com outra gaja qualquer (desculpem, apenas fui casado uma vez e só com uma gaja, a qual morreu entretanto... e ainda não me deu para casar outra vez, seja com gajas ou com gajos) e esse compromisso é válido para efeitos de bens em comum, heranças, disputas divorciáticas e outras merdas do género, nomeadamente... a puta da prole.

Ao chegar a casa de cabelo curto evitei beber. Não é que não me apetecesse, mas estava um dia tão bonito, uma luz tão fantástica, que voltei a enfiar-me no carro e zarpei para o castelo, para fotografar, para sentir o deslumbramento que só a fotografia me proporciona. É certo, tomei um duche antes de sair e abri uma garrafa de vinho apenas para não me tremerem as mãos, mas o ar, o vento, a luz, a névoa e a paisagem não me desiludiram.

A prole é que é uma foda. O problema do casamento dos gays é o problema da prole. Se permitirmos que esses rabetas e essas desvairadas se casem, como é que é de filhos? Hã?.. Para essas putas, com a inseminação artificial e coiso, as cabras safam-se, mas, e os porcos? Fazem meninos por onde, pelo cu? E depois, querem, claro, como não os podem ainda parir pelo cu, querem adoptar, os anormais.

Foi um princípio de tarde lindo. Fartei-me de disparar. A torto e a direito, literalmente. Lembrei-me do Miguel, da sua morte, ele que trabalhava como paquete, garboso, na pousada do castelo. Senti-me tentado a entrar pela pousada dentro e pedir um café em sua memória, só que, a recordação de que gastara quase todo o meu dinheiro em comida, vinho, cerveja e no corte do cabelo travou esse meu instantâneo mental e ao invés voltei para o automóvel e fui para casa apagar fotografias e embebedar-me.

A questão do casamento homossexual não é a questão do casamento em si. A bem dizer, em que é que dois tipos ou duas tipas casarem nos afecta?.. Em que é que isso contribui para a nossa infelicidade, preocupados que andamos com a falta da guita e da mulher que nos ame e que tome conta de nós e nós dela? Puta que pariu, isso do casamento gay é lá com eles, casem-se, eles e elas é que sabem, que temos nós a ver com isso?

Tinha deitado abaixo quatro cervejas e uma garrafa de vinho quando me lembrei das latas de salsichas. Como não gosto de símbolos fálicos (excepto na cama) abri uma lata, esquartejei as salsichas aos pedacinhos, juntei uma cebola picada, mais duas cabeças de alho e deitei tudo a refogar numa sertã com azeite que, entretanto, pusera ao lume. Então, à medida que o aroma da comida se espalhava pela cozinha, reflecti que, finalmente, ficara bonito após cortar o cabelo.

E os filhos adoptivos dos panascas, como é que é? Ficarão eles rabetas como os seus «pais»? Afinal, falta-lhes uma das duas imagens «fundamentais», consoante o caso do matrimónio em apreço, a da mãe ou a do pai, não é mesmo?..

Ao jantar e à medida que ia encorpando a segunda garra do vinho tinto abaixo, apercebi-me da solução para este problema tão trivial e tão estúpido que até me apeteceu gritar: Népia pá, todos os estudos indicam exactamente o contrário, tem a ver com a adolescência e quê, ir contra os «pais» e tal. Filho de rabeta sai straight!

Acendi um cigarro, liguei a televisão ao calhas e ponderei que, para além de estar completamente liso, que uma criança, o que precisa, na verdade, é algo de muito simples e resume-se a três coisas: afecto, educação e dinheiro. Tudo junto para as fraldas, para a atenção, a roupa, para a sensibilidade e para o resto.

Boa noite meu amor.