31.1.07

Fio do Tempo

Percorro o mundo inteiro,
de bússola e carta armado,
caprichosa onda é meu leme,
por cintilante estrela guiado.

Não passo de ledo timoneiro,
sou pobre e solitário marinheiro.

Marcho intrépido, o olhar distante,
infeliz de quem espada desembainha,
monto brioso e possante corcel,
meu orgulho é a ti servir, formosa rainha.

Entre guerra e paz errante,
sou garboso cavaleiro andante.

Deixei fama e riqueza longe,
tomei trapo e simples repasto,
entre quatro paredes orando,
será destino meu ser casto?

Devoto e fiel, a Deus alma rendi,
sou monge humilde, o meu reino jaz em Ti.

Tomei pena como profissão,
da tinta verto as lágrimas
que na pura neve branca
chovem fracas, enamoradas rimas.

Não sei para onde vou,
quem me ler dirá quem sou.

De tanta vida vivida por viver,
cabos dobrados, reinos tomados,
orações perdidas no vento,
penas flutuando no Tempo,
Sherezade contará meu conto,
nunca sem acrescentar um ponto.

Desta breve vida,
de muitas outras mil,
levo a mais segura das certezas,
para nova vida tomar,
novo disfarce roubar,
regressará minha Alma imortal!

Fia, incessante Cloto, traga o fio da vida!
Láquesis, elege o dia da minha ida!
Àtropos, concede-me nova vinda!

Pequeno mortal que sou,
filho de dúvidas e medos,
escravo da continuidade,
que escolha a do anjo em queda,
Ó Moiras da Antiguidade!,
senão ver que eterna teia o enreda?