10.6.07

Construir o futuro


Celebra-se hoje o Dia de Portugal. Ao contrário de certa inteligentsia não tenho sobre o nosso país uma visão miserabilista. Não me revejo naqueles que por dá cá aquela palha se põem a criticar o país e a sua população, num tom geralmente pessimista, do género, “isto não vai lá”, “somos um povo assado, cozido e frito”, “ com mentalidade tacanha” e etc. Não quero dizer com isso que não tenhamos problemas civilizacionais ou outros. Um dos maiores problemas, aliás, é a tendência que demonstramos para considerar que o que é nosso é uma merda e que o que vem de fora é o supra-sumo da excelência. Paradoxalmente, aqueles de nós que vão para fora para se melhorarem são vistos com desconfiança e em muitos casos com inveja e rancor. Já assim o era no tempo dos “estrangeirados” do Marquês e continua a sê-lo, embora em menor grau, neste princípio do séc. XXI. Daí, aliás, a tão propalada “fuga de cérebros”.

É certo que há neste país uma tendência quase inata para a mediania: somos todos muito humildes e aqueles que o não são acto contínuo são catalogados de arrogantes. É pois um dos principais paradoxos nacionais: o que é de fora é melhor, quem vai para fora vem de lá arrogante e não presta. Na opinião do cronista isto radica em grande parte no putativo valor da humildade, que a meu ver pouco ou nenhuma importância possui.

Eu, por exemplo, não sou humilde. Estou-me nas tintas para a humildade, embora tente manter o espírito aberto (nem sempre com sucesso) e não me custe nada reconhecer quando laboro em erro. Esse é outro problema: convivemos mal com a crítica. Tendemos a pensar que esta é na essência algo de negativo e esquecemos que a crítica tem um valor positivo: são as críticas que nos fazem crescer. São estas que apontam as nossas lacunas e nos fazem ver onde necessitamos de melhorar. Mais uma vez, a inteligentsia nacional age em relação à crítica de forma paradoxal: aí de quem critique, e ao mesmo tempo tudo se critica, destrutivamente: os governos são uma merda, o povo um bando de incultos e o país uma choldra. Não sei sinceramente se algum dia mudará esta tendência tipicamente lusa. O que sei é que, particularmente no dia de hoje, devemos ter orgulho naquilo que somos e não o contrário. Somos nação há perto de 900 anos; temos uma tradição literária absolutamente fantástica; fomos um país que se lançou ao mar e tornou o mundo um local mais conhecido; temos do Mundo e dos outros uma visão humanista, tolerante, democrática e progressista, ao alcance apenas de meia dúzia de países. Fomos pioneiros na abolição da pena de morte, demos pintores e músicos de nomeada ao mundo; temos um riquíssimo património histórico, cultural e linguístico.

É certo, a Reforma não passou por aqui e isso está na raiz de todo o nosso atraso, quando nos comparamos aos países do Norte da Europa. Seja como for, se há coisa que considero essencial é que nos deixemos de lamechices, de críticas destrutivas, de fados, de noções perversas do que é o Respeito e de humildades provincianas que apenas nos paralisam e fazem com que não avancemos. É preciso acreditar. Portugal tem um passado e um futuro a cumprir. Este pequeno país periférico sobreviveu durante séculos às piores intempéries e a espaços soube transcender-se e tornar-se no centro do Mundo. O que nos falta resume-se a auto-confiança, no seu sentido positivo, como a definiu há tanto tempo Emerson no magistral ensaio “Self-reliance”, cuja leitura recomendo vivamente.

Deixemo-nos de tretas. Aqui há dias fui confrontado na minha actividade profissional com a tradução do inglês para o português de um prospecto de uma multinacional. Na versão inglesa a dado passo podia ler-se: “we can and we will do…” Na tradução em português o que se lia era o seguinte: “podemos e queremos fazer…” Trivial quanto seja o exemplo explica muito. Em inglês “pode-se” e “faz-se”; em português “pode-se” e “quer-se fazer”. Isto tem de acabar. Humildades de merda não nos servem. Nós não só podemos, como fazemos, sem margem para dúvidas. E o primeiro que disser que é arrogância assim pensar, faz parte de um Portugal em que não me revejo.

Isto dito,

VIVA PORTUGAL, VIVAM OS PORTUGUESES.